Como vocês sabem, faço aulas de Inglês diariamente no Brooklyn Adult Center, uma school que fica a dois blocks (o que chamamos de quadra) da minha casa. O curso é uma oportunidade é tanto. Para mim, que passo boa parte do tempo infurnada em Manhattan, nas dependências da chiquérrima NYU's Library, o BALC (Brooklyn Adult Center) representa um momento muito especial, a possibilidade de viver com pessoas reais, com gente como a gente, pois esta é uma sensação que não sinto na NYU.
A professora - Victoria Capeci (na foto acima) - é um capítulo à parte. Ela é descendente de irlandeses. Dá aula há quase 20 anos e tem uma enregia que vocês não podem imaginar. Aliás, podemos sim! Estamos na sala de aula aí no Brasil. Ela "se vira nos trinta" legal.
O curso é uma experiência bem forte, parecemos estar numa grande família. Há pesosas de todo o mundo: Iemen, Guiné Bissau, República Dominicana, México, Senegal, Haiti, Marrocos, Índia. Não há como mensurar o que isso implica na transformação do ser humano. São tantas culturas coexistindo, é algo muito forte e bonito de se viver... Todos os dias agradeço a Oxum e Ogum por essa oportunidade, e, não poucas vezes, me emociono nas aulas...
Na minha turma, por exemplo, há pessoas em torno dos 40 anos que estão se alfabetizando agora. Deixaram seu país, sem saber ler e escrever, sabe se lá como, em busca de uma vida melhor por aqui. Em outras palavras, vieram "fazer a América"... Há um clima de mistério que ronda a sala de aula. Não resta dúvidas que há vários imigrantes ilegais ali dentro... fato mais que comum em toda a cidade, em especial nos poor neighbourhoods (bairros pobres).
Alguns dos meus amigos fazendo um lanchinho. Na frente, o Saleil de Bangladesh está estudando.
A gente tem uma imagem muito caricaturada dos US, então muitas coisas aqui surpreendem. Por exemplo, não pude acreditar que na sala de aula, para trabalharmos listening (escuta), Victoria usa um gravador de fita cassete. My God, até nas escolas públicas aí do Brasil não vemos mais esses aparelhos. É impactante ver uma gambiarra com um fio cruzando a sala para que o gravador fique em cima da mesa de Victoria considerando que isso acontece em New York City. As instalações do curso denunciam o descaso e a falta de recursos destinada a essa escola, embora para o meu olho, ela seja muito boa. O mesmo comentário se aplica ao meu bairro - Bed Stuy - ele foi o primeiro bairro de ex-escravos. Reduto de latinos e negros, Bed Stuy é um bairro pobre, embora aos meus olhos seja difícil associá-lo á pobreza. Mas com o tempo você vai percebendo, é um outro tipo de pobreza da que vemos aí no Brasil. As ruas são limpas, há saneamento básico, calçamento, mas percebemos pouca iluminação e transportereduzido de noite. Além disso, os tiros na madrugada e a patrulha policial que sempre fica na Fulton Street também denunciam... anyway...
Como vocês sabem, imediatamente tornei-me amigas das muçulmanas. Acho que temos uma relação de alteridade muito forte. Elas são um mistério pra mim, eu um enigma pra elas. É um clima de escola mesmo. Toda vez que chego atrasada, tenho meu lugar guardado pela Farvin. Ela faz questão que eu sente do lado dela toda aula. E eu adoro, a gente ri e conversa bastante. Ela é muito bonita. É filha de professores universitários, e me conta que foi criada com mais liberdade. Entre as muçulmanas de minha sala, Farvin é a única que usa calça jeans e tenis Nike. Sinais da sua liberdade... Ela é solteira, e está esperando um good man para se casar e ter filhos. E quer a todo custo que eu me case também. Eu respondo: "tá bem Farvin, mas também quero um good man". E ela ri... ri bastante... Elas não conseguem entender o que uma jovem vem fazer completamente sozinha nos US, e por conta disso resolveram me adotar. Me ligam aos finais de semana, me convidam paraà Mesquita e sempre estão comigo no curso. Gosto tanto delas, que meu olho se enche de lágrimas. Elas são muito queridas! Nunca imaginei que um dia teria amigas muçulmanas...
Eu e FarvinHá ainda outras amigas: a Munira, que já apresentei a vocês e a Shrin, que em breve será apresentada. Além dessas meninas, há muitos haitianos no curso: o Jim, o Edriss e a Nathanael são alguns deles. Sua primeira língua é o Francês. Esse é um outro aspecto que torna o curso uma experiência mágica. Ver e ouvir o Inglês nos mais variados sotaques... onde o brasileiro é mais um...
Há ainda a dominicana Rosa. Conversamos muito. Ela está nesse país há dez anos, é casada e tem filhos. O sonho dela é que seus filhos façam faculdade aqui. Rosa fala Inglês bem, mas resolveu estudar... Fica muito difícil traduzir essa experiência em palavras. Todos os dias alguém está triste, com os olhos marejados... isso já é normal, e naturalmente, nesse dia essa pessoa é tratadade forma especial. Ela pode ganhar um doce, ser a escolhida para ler o texto em voz alta ou algum outro tipo de mimo que a professora inventa ou que nós, seus "parentes", criamos.
Eu e Rosa
Já estive assim vários dias, e foi muito bom receber abraços dominicanos, beijos banglas, sorrisos haitianos... E dessa forma, os dias vão passando no Brooklyn Adult Center...
Oi Giovana,
ReplyDeleteNão canso de me entusiasmar com as "news" do teu blog. Tua experiência tá me ajudando a pensar no futuro. Valeu! Continue escrevendo.
Abraços,
Vera
Coé Pretologa!
ReplyDeletePassando pra dizer "said" que teu blog esta massar "the very best". Saudades pra car@*/% e nem preciso comentar que suas cronicas são importantes como ponto de contato para todos nos que vivemos essa experiência diasporica, ainda que totalmente voluntaria! Axé e um beijo muito muito grande mesmo!
Deri.
querida,
ReplyDeleteisso é que é diversidade, hein! deve ser muito boa essa experiência de conhecer pessoas de vários lugares do mundo, diferentes universos, fronteiras e costumes...o bom é que todo mundo cabe no coração da gente, o difícil é coseguir encontá-los por aí...mas NY é isso, né?
Tem um poema que eu gosto muito, que é o seguinte:
Fronteiras
Os corações
(assim como as pátrias)
não deviam ter fronteiras.
Queria explodí-los
em suspiros, anátrmas
para que de tantos pedaços
brotassem outras centenas.
Os corações
(assim como as pátrias)
não deviam ter fronteiras...
mas têm.
(Mauro Iasi)
Beijos,
Bel
Que lindo o texto, Gi! Muito lindo...não passei por uma experiência dessas, meu bairro era simples, mas menos pobre, mas entendo completamente suas sensações, pois elas são minhas em muitos sentidos. Bjs, querida. fique com Deus - ou com Ogum e Oxum - e aproveite muito essa experiência, como vc tem aproveitado.
ReplyDeleteQue delicia seu blog. Muito sensivel a forma como voce descreve suas experiencias.
ReplyDeleteEu, que sou imigrante de muito tempo, ainda me pego pensando nessas coisas de "sozinhude" e no entendimento da minha cultura pelo afastamento dela.
Gostei daqui, muito.
Oi! Cheguei aqui pelo Sublime Sucubus. Desculpa a invasão... rs
ReplyDeleteDeve ser tão legal ter contato com tantas culturas diferentes, línguas diferentes... a gente costuma pensar que vai ficar perdida, mas parece que em vez disso encontramos um pouco de nós na diferença do outro.
Temos mania mesmo de achar que só porque é "primeiro mundo" tudo vai ser perfeito e de última geração. Deve ser bem surpreendente quando descobrimos que nem tudo é perfeito por aí.
Morro de vontade de conhecer os USA um dia. Até lá fico me impressionando com os comentários dos que estão conhecendo. :)
Beijos, moça.
Oie meninas;
ReplyDeleteObrigada por visitarem meu blog. Andei um tempinho sem escrever, mas aos poucos vamos retomando os relatos dessa experiência mágica diária. Fico emocionada de poder compartilhar os caquinhos desse colorido mosaico com vocês. Bem-vindas ou melhor Welcome Guys! Um beijo!!!
Oi, Gi, td bem??
ReplyDeleteQue saudade, me sinto em falta com você. Fiquei muito feliz de vc me mandar notícias e adorei o piercing, este acessório deve ter lhe deixado ainda mais linda. Aproveite esta experiência, tanto pessoal quanto profissionalmente.
Estou na correria, aqui, com o Doutorado.
Bjs, Antonia, Luana e Almir.
você nem sabe quem eu sou, e eu fico fuçando em seu blog...rsrs
ReplyDeletemto bacana as postagens
tudo de bom p vc!