Saturday, March 28, 2009
Exercitando a Sozinhude
De pés e coração na Mesquita
Na sexta-feira, dia 20 de março, eu fui conhecer uma Mesquita. God!!! É uma experiência de fato inenarrável. No meu curso de Inglês e em New York como um todo existem muitos muçulmanos. No início eu ficava com torcicólo porque sempre me virava para ver as mulheres de véu e os homens vestidos com jibab, que eu na minha humilde ignorância chamava túnica.
No meu maravilhoso curso de Inglês, tive a oportunidade de fazer amizade com elas. Já contei para vocês: elas querem ter cabelo curly (cacheado) como o meu, e por isso estabeleceram comigo o primeiro contato. Isso foi surreal, porque eu no meu total desconhecimento carregava em minha mente estereótipos que a mídia insiste em construir. Ridiculamente, imaginava mulheres andando o tempo todo de cabeça baixa e sem falar com ninguém. Nossa, dá até vergonha de pensar que eu já pensei isso um dia. Mas, como viver é aprender, cá fui eu para uma Mesquita.
Sexta-feira é um dia importante para os muçulmanos. Nesse dia há uma pregação especial feita pelo Iman (seu líder religioso). Nesta sexta, tudo foi mágico para mim. Munira e Farvin, minhas amigas mais próximas do curso, respectivamente do Iemen e de Bangladesh, não puderam me acompanhar. Quando as mulheres menstruam não podem ir à Mesquita participar da cerimônia. Em outra ocasião, explicarei o porque, antes que sejamos seduzidos por explicações óbvias do tipo: quanto preconceito, quanta opressão... No Islã, tudo tem um sentido, tudo é explicável. E isso para mim que sou cheia das perguntas foi um prato cheio como vocês podem imaginar.
Pois bem, fui acompanhada por Fátima. Ela é Marroquina e deve ter em torno de 40 anos. Uma mulher forte no olhar, no jeito de falar, em tudo. Ela estava com sua filhota, a pequena e simpática Aiete. Fátima me levou até um brother que me deu importantes explicações. Depois eu fui almoçar em um restaurante muçulmano... Ai, ai, ai, quanta coisa gostosa esse povo come!!!! Fiquei no peixe e na saladinha... Muito good!!!
Antes disso, Fátima - de forma extremamente maternal - colocou-me o véu, o scarf (lenço em Inglês, esqueci de perguntar como é em árabe!!!). Pronta, de véu, mochila, calça jeans e jaqueta, entramos. Lá, temos que ficar descalças. Recebemos sacolas para guardarmos nossos sapatos. O clima é bastante animado!!! Muitas mulheres com véus de todas as cores e tipos, com pedras, bordados, sedas, conversam em tom alto e animado. Ao se reencontrarem se abraçam longamente, dão beijos bem estalados e ficam bastante felizes de ver um novo rosto ali prestigiando a sua religião.
Fátima me avisa que quando começar a pregação não poderá mais conversar. Sim, "I understood Fátima", respondo a ela com meus olhos arregalados. AInda dá tempo de perguntar como devo proceder caso eu queira fazer as orações. Ela me leva ao banheiro e me ensina o ritual islâmico. Ninguém lá dentro é obrigado a rezar, mas caso queira tem que antes purificar o corpo. Esta purificação consiste em lavar as mãos e a boca três vezes, os braços até o cotovelo uma, os ouvidos, o rosto e os pés. Existe uma ordem para isso, que eu não consegui decorar. Além disso, você tem que ir com roupas limpas, sem nenhum tipo de sujeira em respeito a Alah.
No salão em que as mulheres ficam, há uma televisão. É através dessa televisão que assistimos à pregação. Uma parede nos separa dos homens e do Iman. Assistimos à pregação dele via televisão. Há espaços separados para homens e mulheres. E, ao contrário do que nossas mentes ocidentalizadas nos induzem a pensar, a experiência nem por isso deixa de ser menos intensa. Pra falar a verdade, é bem forte o sentimento de estar sozinha entre pares femininos reverenciando a um mesmo Deus, nesse caso, Alah.
Muitas coisas me chamaram atenção. Parte da pregação consiste em se abaixar e bater a cabeça, de forma bem parecida com a que fazemos no Candomblé. Além disso, todas nós sentamos no chão, apenas as convidadas sentam em cadeiras. Fátima queria me dar uma cadeira, mas recusei... Não vi motivos para isso e ela pareceu feliz com minha recusa. Ao final, rezamos de pé em conjunto, nesse momento é necessário que seu dedo mindinho se encaixe no de sua sister.
A pregação é muito bonita, muito forte, muito contagiante. Várias vezes chorei, me senti muito feliz de estar ali, e, agora, ao narrar o que vivi há uma semana, as lágrimas da sozinhude retornam.
O Iman falava da necessidade dos maridos cuidarem de suas esposas, porque a mulher era o pilar da família. Dizia ele: "his wife is my sister" (sua esposa é minha irmã)! Foi bonito ouvir isso, mexeu comigo... Ele intercalava o Inglês com o árabe, e pelas expressões todas pareciam aprovar suas palavras. Lembrava ainda da importância de se cuidar da saúde, e chamava atenção especialmente das African American para cuidarem da sua pressão arterial, visto que há pesquisas que comprovam que a pressão alta acomete mais este grupo.
Obrigada Fátima, você está eternizada no meu coração!!!
Friday, March 6, 2009
Black Feminisms e uma little tiete
Ontem foi dia de novas aventuras. Fui conhecer New Jersey. É um outro estado coladinho a New York, é possível ir de trem, a viagem leva 40 minutos. Lá tem a Rutgers University, onde tenho duas amigas: Kim, que é professora de lá e Amana, sanduicheira como eu...
Pois bem, esse é um bom pretexto para conhecer novos lugares: "turismo acadêmico"!
Eu fui para a conferência "Black Women in the Ivory Tower" (Mulheres Negras na Torre de Marfim). Essa é uma expressão muito utilizada aqui para se remeter à academia de uma forma geral.
A expectativa era muito grande... afinal este seria o meu primeiro contato com as feministas negras nos EUA. Nomes tão familiares nas minhas inúmeras buscas com meu amigo irmãozão Adriano pelas estantes da biblioteca do IFCH, em um instante se tornavam pessoas reais... Pelos crachás, ia identificando várias delas, e como não entendia totalmente o que falavam e não conehcia ninguém, ficava por vezes viajando, achando inacreditável que isso pudésse estar acontecendo. Mas é, foi real. Um real forte, bonito, emocionante, comovente.
Nessa conferência, as comparações com os espaços feministas negros aí no Brasil pipocavam.
Como aí, mulheres com bebês e seus carrinhos, crianças maiores brincando...
Enquanto a mãe milita, ela se diverte...
Momento bonito, forte, mágico. Um encontro de gerações entre jovens e "jurássicas", unidas por dores, angústias, esperanças...
A magia das muçulmanas...
Por aqui o tempo começa a andar mais rápido, a rotina exaustiva de leituras infinitas agora começa a ser conciliada com mais uma nova empreitada: o curso de Inglês. Vamos aos fatos:
Cenário: Brooklyn Adult Center em Bed Stuy, a duas quadras (aqui dizem blocks) da minha casa.
A escola é como aquelas que a gente vê em filmes como "Escritores da Liberdade"... só que nesse caso, Hilary Swank, a "Menina de Ouro", perde para mim...
Não sei se as palavras dão conta de explicar este momento mágico, inesquecível. Sou levada à sala de aula pelo professor - muito simpático que fez o teste comigo. Nos corredores, alunos blacks and latins (aqui são coisas diferentes, outro dia explico!). Para mim estes instantes foram eternos, não sabia o que iria encontrar... e já cansada dos cursos de Inglês tradicionais que sempre trazem John e Mary como personagens, confesso que mesmo com todo meu otimismo, não fazia prognósticos muito positivos...
Pois bem, quando eu chego na porta da sala, a Teacher, Victoria Capeci, muito simpática interrompe a aula e meus novos colegas me dão "welcome". Podem imaginar? Nem eu... Entre eles, muçulmanas que falam Bangla, mexicanos, franceses, yemens... Pois é, o "bagulho é doido"! Não tem jeito, a transnacionalidade nos empurra para o Inglês, único ponto aparentemente em comum que compartilhamos. Esse foi meu ledo engano...
Ao fim da aula, que por sinal é muito boa, as muçulmanas se juntam e vêm ao meu encontro. Isso mesmo: "de bando"! Felizes, sorridentes, amigas, queridas. Uma delas que não fala Inglês chama a sua "interpréte". Ela precisa desesperadamente saber o que eu uso no meu cabelo, pois o dela é igual ao meu... Eu explico e ela anota desesperadamente. Tomada pela curiosidade, já que sua burka me impede de ver seu cabelo, pergunto como ele é: ela diz em gestos: "como o seu, só que maior". A burka fazia com que seu belo rosto se tornasse ainda mais expressivo... e, como uma criança pura, ela segura nos meus cachos, maravilhada, encantada...
Todas se despedem muito felizes e eu, mais ainda... a simplicidade e a força desse momento foram mágicas pra mim...
Com a vitalidade dessas meninas, ganhei minha sexta-feira...
Munira e um de seus filhos
Wednesday, March 4, 2009
New York é o caldeirão...
Pois é... quem diria, a mais provinciana das cariocas aqui em NYC, nem eu imaginava isto, mas cá estou...
Aqui, como já disse em outras ocasiões, têm muitas coisas interessantes, aliás, como em qualquer lugar do mundo... Logicamente que toda generalização é perigosa, mas a um primeiro olhar, nas salas e corredores da NYU Library (Biblioteca da NYU), o que s eobserva são asiáticos andando com asiáticos, negros com negros, indianos com indianos e por aí vai porque etnias não faltam aqui...
Não quero dizer com isso, evidentemente, que as pessoas "não se misturam", afinal mistura existe em qualquer lugar do mundo, mas é interessante observar a formação destes microgrupos étnicos presentes nas ruas, nos restaurantes, no train (metrô). Aí no Rio de Janeiro dizem que o Salgueiro - nosso campeão do Carnaval 2009 - "é o caldeirão", mas eu arrisco outro palpite: New York é o verdadeiro caldeirão!!!
Como lidar com tanta diversidade? Sinceramente, I don't know (eu não sei). É engraçado isso, porque o sentimento que eu tenho é que aqui é tão diverso que, por conseqüência tudo e tod@s são ou podem vir a ser nova iorquinos. Logicamente, que "o buraco é mais embaixo", mas a um primeiro olhar tudo "can be" (pode ser).
Imaginem em um mesmo local as seguintes personagens e cenas: uma mulher com burka lendo o Alcorão, dois africanos conversando em crioulo, uma mãe porto riquenha brigando com seu filho, uma jamaicana trançando seu cabelo, uma afrobrasileira (eu!) lendo um livro em Inglês (tentando!) e, tudo isso, sob a contagiante dança de meninos balck american exibindo passos sofisticadíssimos de dança ao som do bom e velho break. O cenário? MTA New York, ou para os mais intímos, simplesmente train (metrô). Diz aí agora! É ou não é o caldeirão?
Welcome to my afroblog!
Finalmente, ou melhor, finally! Resolvi aderir à epidemia e virar mais uma bloggeira de plantão. Cá entre nós, nem tão assim de plantão, porque afinal babies estou em New York City e há muita coisa para fazer aqui além do blog. Ahahaha!
Aliás gente, aqui é tanta diversidade que fico perdida. Agora já estou um pouquinho mais acostumada. Coisas básicas como esbarrar numa muçulmana, dividir o banco do train com um indiano, ouvir vozes em crioulo, turco, árabe pelas quebradas de New York vai aos pouquinhos se tornando parte da meu dia a dia, mas com certeza isso nunca será natural para meus olhos e ouvidos. A cada dia escuto uma nova palavra, sinto um novo cheiro, saboreio um gosto inédito!
Realmente não há palavras para descrever o sentimento de estar aqui. Uma oportunidade única! (Nesse caso é tão única que justifica a redundância da frase acima).
E, evidentemente, não há um dia que não lembre da minha terra, de vocês, que são o "meu pessoal". Uma vez fiz um curso no Museu Nacional sobre Pós-Emancipação comparadas no Caribe. Na primeira aula do curso, a querida professora Olívia disse que às vezes "era necessário nos afastarmos de nosso contexto para assim entendê-lo melhor".
Nauqela ocasião, quando eu ainda era a carioca mais provinciana da face da terra, não consegui alcançar a riqueza de seu pensamento. Hoje, passados 51 dias que estou aqui, compreendo e, evidentemente concordo com ela. Olívia, você está com a razão!
Gente, eu quero que esse blog seja um espaço nosso. Para nossas vozes, cores e credos...
Quero continuar celebrando o carinho, a amizade e o amor compartilhando com vocês minhas impressões sobre este lugar tão múltiplo, com o qual tanto tenho aprendido.
Quero compartilhar com vocês os retalhos do que venho pensando, para que com a ajuda de vocês consiga sair daqui com uma colcha bem colorida. Um colorido forte e ativo como o meu, o nosso sol carioca, que aí New York que me desculpe, não tem pra ninguém porque o Rio é chapa quente o ano todo!
Sintam-se bem vind@s para celebrarem comigo esta experiência!
Uma beijoka especial com muito amor da Gi, Gigi, Giovana!